Ecocompas,

  Segue reportagem da revista Caros Amigos sobre a Rio+20, onde fui um dos entrevistados.

  Boa leitura e aguardo as críticas!

  Abraço ecossocialista!

  Beto Bannwart / Coordenação Nacional Setorial Ecossocialista PSOL


CONFERÊNCIA MUNDIAL

RIO+20 E A HIPOCRISIA AMBIENTAL

Estudos indicam que países não cumpriram
as decisões da Rio–92 sobre o desenvolvimento sustentável.

Por Bárbara Mengardo

Tema que há não muito tempo tomou o nosso dia a dia, o Desenvolvimento Sustentável será 
a estrela principal da próxima conferência da  Organização das Nações Unidas (ONU), programada para acontecer entre os dias 13 e 22 de junho na cidade do Rio de Janeiro. 
A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, também conhecida como Rio+20, reunirá representantes dos 193 Estados-Membros das Nações Unidas para debaterem temas como mudanças climáticas, desmatamento e proteção aos mares e florestas, a fim de tirar uma agenda de ações globais.
O encontro, no entanto, está à frente de uma série de críticas antes mesmo de acontecer. Muitos estudiosos e ativistas na área ambiental não acreditam na eficácia das conferências da ONU, e temem que o Rio de Janeiro possa ser palco, em junho, de mais um teatro, onde os líderes de Estados e as corporações se eximam de suas responsabilidades na destruição do meio ambiente. 

zero DRAFT
Seu nome já explica: a Rio+20 acontece 20 anos após a Rio-92 (veja box), conferência que, em 1992, difundiu o termo desenvolvimento sustentável. O objetivo do segundo encontro seria, desta forma, o de avaliar os progressos, aprimorar as ações que levam ao desenvolvimento sustentável e discutir novos temas que surgiram de lá para cá.
Esse propósito, no entanto, sofreu alterações, conforme explica Fátima Melo, da ONG FASE - Solidariedade e Educação: “A Rio+20 de início se propunha a fazer a revisão dos tratados e convenções criados na Rio-92, e lançar uma nova agenda. O principal era fazer essa revisão para ver as lacunas que tinham ficado, mas esta agenda caiu, porque os governos não querem ficar expostos ao fato de não terem implementado o que se propuseram há 20 anos”.
Estudiosos da questão ambiental afirmam que, desde a Rio-92, os países realizaram nenhuma ou quase nenhuma mudança na maneira como se relacionam com o meio ambiente. Segundo o sociólogo Michael Löwy, apenas mudanças superficiais foram promovidas: “Enquanto a crise ecológica se agrava, os governos - para começar o dos Estados Unidos e dos demais países industrializados do Norte, principais responsáveis do desastre ambiental - desenvolveram, em pequena escala, fontes energéticas alternativas, e introduziram mecanismos de mercado perfeitamente ineficazes para controlar as emissões de CO2. No fundo, continua o famoso business as usual, que, segundo cálculo dos cientistas, nos levará a temperaturas de 4° ou mais nas próximas décadas”.
Devido ao fato de muito pouco ter mudado desde 1992, os governos optaram por deixar de lado o objetivo principal da Rio+20. Esse fato se torna explícito no Zero Draft, documento lançado em janeiro desse ano que traz um compilado de propostas, e guiará as discussões em junho.
O Zero Draft reuniu em 19 páginas todas as propostas enviadas pelos Estados membros das Nações Unidas, e é considerado uma prévia do que será a Rio+20. O documento não trata 
apenas de temas diretamente ligados ao meio ambiente, e toca em assuntos como erradicação da pobreza, igualdade de gênero, direitos dos povos indígenas, etc.
Suas páginas são recheadas de constatações que até hoje nunca saíram do papel nem mesmo entre os países pertencentes à ONU, e reafirma temas que tantas vezes já foram tratados em outras conferências. Por estes e outros motivos o Zero Draft é alvo de críticas: “O que mais me impactou (no esboço zero) é que os países não reconheceram aqueles princípios que eles próprios constituíram e foram signatários. É um esquecimento propositado para justificar a reafirmação de um modelo que é exatamente o que tem causado problemas históricos para todas as populações”, afirma Iara Pietricovsky, do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). 
Fátima exemplifica um importante princípio que pode ser deixado para trás durante a Rio+20: “Quando o Zero Draft coloca metas de desenvolvimento sustentável, ele iguala todos os 
países, e isso fere um dos princípios que sempre orientou as negociações desde a Rio-92, que é o das responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Isso significava que os países que historicamente poluíram mais têm uma responsabilidade maior”.

MAQUIAGEM VERDE
Um tema que aparece diversas vezes durante o Zero Draft, e que provavelmente será a bola da vez a partir da Rio+20 é a economia verde, que também tem encontrado muitos críticos. Iara explica a origem do termo: “Esse conceito foi desenvolvido e aprofundado a partir de um relatório do Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), de 600 páginas, que diz o seguinte: ‘A gente não precisa mudar nada no mundo, o que a gente precisa é tirar um percentual do dinheiro circulante e aplicar em tecnologia que vai produzir a redução de emissão de gases do efeito estufa’”.
Na prática, a economia verde nos moldes do Pnuma poderia gerar uma dependência dos Estados em relação à iniciativa privada, já que seria papel da última criar mecanismos que tornem os países e as indústrias mais verdes.
Desde sua concepção, a economia verde nunca pretendeu quebrar com o modelo de produção consumo estabelecido, e o Zero Draft aponta que a Rio+20 provavelmente não fará diferente. Prova disso é que o documento ressalta a importância da iniciativa privada na promoção do desenvolvimento sustentável, chegando a utilizar o termo consumo sustentável. 
Para Beto Bannwart, da Coordenação Nacional do setorial ecossocialista do Partido Socialismo e Liberdade (Psol), o termo é uma tentativa do atual sistema econômico de fazer uma maquiagem verde para ocultar os desastres ambientais que ele mesmo provoca: “A questão da economia verde é uma tentativa do sistema de se renovar. No meu entendimento, a economia verde vem no sentido de tentar construir um modelo econômico para sustentar o novo ciclo de renascimento do capitalismo, que seria uma espécie de eco-capitalismo, ou capitalismo verde”. 
Outra preocupação em torno da economia verde é que ela traga um aumento cavalar na mercantilização da natureza. Fátima explica: “Um grande problema da economia verde é: como financiar a transição (entre a economia atual e a verde)? Dando um preço aos recursos naturais; água, ar, terra, biodiversidade, tudo vai receber um preço”.
Na prática esse processo já ocorre, principalmente por meio de REDDs (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação). Através deles, empresas ou países poluidores podem comprar extensões de florestas ainda preservadas (em geral em países como Brasil e Indonésia), como mecanismo de compensação pelo mal que fazem ao planeta. 
Fátima exemplifica: “Uma empresa nos 
Estados Unidos, por exemplo, que emite mais carbono do que pode e quer ter saldo para emissão compra esse saldo através de um contrato com um território indígena. A população que assina esse contrato perde o direito sobre sua terra, e não pode decidir autonomamente, por exemplo, como fazer seu roçado, porque pode estar violando um contrato que supõe que a terra vai estar ali, inalterada”.

GOVERNO
O fato da Rio+20 acontecer em solo brasileiro faz do Brasil o Presidente da Conferência. Segundo informações da assessoria de imprensa do Ministério das Relações Exteriores, nessa posição o país “tem que tentar promover um consenso”, e não adianta “ter uma posição vanguardista, de tentar empurrar propostas que sabemos que não serão aceitas”.
O Ministério afirmou ainda que espera “que os resultados da Conferência sejam ambiciosos”, e sobre as críticas em relação à ineficácia de Conferências como a Rio+20, afirmou: “Se você olhar só para o que não avançou, vai cair nos velhos diagnósticos. Todo mundo sabe o que falta avançar e porque não avançou, às vezes é preciso, ao invés de olhar para o lado negativo, pensar o que é necessário fazer daqui para frente”.  
O país, no entanto, é alvo de críticas do ponto de vista ambiental. Para Iara, nessa questão o governo brasileiro tem uma relação ambígua: “Por um lado, o Brasil acena com o corte de emissões na COP-15 em Copenhagen, faz um discurso emocionante para o mundo e o mundo espera dele protagonismo nessa questão, mas o Brasil interno não tem nada disso. A bancada ruralista no Congresso começou a abrir aquilo que nós, por tantas décadas, conseguimos formatar como princípios e parâmetros legais de preservação”. 
Ela cita o novo Código Florestal como principal exemplo desse processo, mas existem muitos outros, como exemplifica Beto: “As obras principais que o governo tem tocado aqui no Brasil, como Belo Monte, Reforma do Código Florestal, Usina Nuclear de Angra 3, transposição do Rio São Francisco e liberação dos transgênicos são medidas de uma política de crescer a qualquer custo, sem levar em consideração as questões socioambientais”.
Atualmente, o agronegócio está à frente da economia brasileira, mas para muitos, ele é o exemplo perfeito de uma prática que vai no sentido contrário da preservação da natureza e sustentabilidade.  
“Esse sistema utiliza muito veneno, envenenando o trabalhador, o solo, a água e sobretudo os próprios alimentos que são vendidos. As monoculturas simplesmente produzem e importam matéria prima, que não tem nenhum valor agregado e, com isso, não empregam uma quantidade grande de trabalhadores. Além disso, elas estão avançando na Amazônia, no cerrado e no Pantanal, desmatando e envenenando os rios”, afirma Joaquim Pinheiro, membro da coordenação nacional do MST (Movimento dos trabalhadores sem Terra). 
Como alternativa a esse sistema, ele cita a agroecologia, que visa produzir respeitando o trabalhador e as dinâmicas de cada ecossistema e abandonando o uso de agrotóxicos, transgênicos e monocultura, que esgota os nutrientes do solo. “Mas, para isso, é preciso colocar as nossas universidades para produzir tecnologias e conhecimentos em torno dessa questão, além de aplicar recursos do Estado para fomentar os produtores a iniciarem esse processo de transição rumo a uma agricultura sustentável” afirma.
Ainda na esteira dos aspectos nada verdes do governo, Renata Camargo, Coordenadora de políticas públicas do Greenpeace, aponta: “(o governo) não criou novas unidades de conservação, e não foram criadas novas leis ou maior rigor sobre as questões ambientais. Tivemos retrocessos, na verdade, como a medida provisória que está tramitando agora no congresso que reduz áreas de unidades de conservação (A MP 558 prevê a redução da área de quatro unidades de conservação na Amazônia)”.
Duas práticas defendidas pelo governo como “verdes” são a produção de energia a partir de usinas hidrelétricas e os chamados biocombustíveis como opção à gasolina. Joaquim critica ambas: “A forma como é feita a produção de etanol tem um custo social altíssimo, com grandes fazendas produtoras de cana-de-açúcar onde se utiliza monocultura, trabalho escravo e onde se contamina o solo e a água. A quantidade de fuligem que é distribuída nas cercanias dessas grandes fazendas é enorme, e o nível de doenças
respiratórias é muito grande, principalmente em crianças”. 
Sobre a obtenção de energia a partir de grandes hidrelétricas, ele afirma: “É possível construir pequenas e médias usinas hidrelétricas, onde o impacto social e ambiental são mínimos; mas são feitos grandes projetos, que tem um custo ambiental e social muito grande, porque para as grandes empreiteiras é mais lucrativo”.
Organizações como o Greenpeace defendem ainda que a energia solar e eólica são soluções viáveis inclusive para o Brasil, mas necessitam de investimento e regulamentação. 
Renata também cobra uma postura mais eficiente do governo no combate ao desmatamento. Ela propõe: “Nós temos, hoje no Brasil, um percentual muito grande de terras degradadas, que foram utilizadas para pecuária e agricultura. (Os agricultores) começam a abrir novas terras, desmatar novas áreas, ao invés de tentar recuperar essas, manejar outras atividades possíveis”.

MIGRANTES
É impossível descolar a questão ambiental das desigualdades sociais. Além de serem fruto do mesmo modelo de produção, os desastres naturais e mudanças climáticas prejudicam diretamente as populações historicamente exploradas.
Michael desenvolve: “As primeiras vitimas dos desastres ecológicos são as camadas sociais exploradas e oprimidas, os povos do Sul, e em particular as comunidades indígenas e camponesas, que veem suas terras, suas florestas e seus rios poluídos, envenenados e devastados pelas multinacionais do petróleo e das minas, ou pelo agronegócio da soja, do óleo de palma e do gado”.
Existe ainda uma relação direta entre a questão ambiental e os processos migratórios. Quando a exploração desenfreada do meio ambiente causa sua destruição, são as populações mais pobres que sofrem por terem seu meio de subsistência arrasado. Em situações como esta tais populações não tem escolha, senão migrarem para os centros urbanos, e viverem em péssimas condições. 
“Os impactos ambientais estão acirrando as desigualdades, deslocando populações dos modos de produção e consumo oriundos de suas culturas específicas, sendo essas culturas destruídas. Essas populações estão sendo retiradas dos seus espaços e ficam vagantes no mundo”, afirma Iara.
E não é preciso ir muito longe para conseguir exemplos de processos como os citados acima. Especialistas afirmam que a usina hidrelétrica de Belo Monte, que está sendo construída no Rio Xingu, pode causar sérios impactos ambientais, prejudicando as populações locais: “Os indígenas precisam da floresta para sobreviver e os pescadores, dos peixes, então eles vão ter seus meios de subsistência afetados”, diz Beto. 
Outro exemplo desse deslocamento e seus efeitos que pode ser percebido aqui no Brasil é o caso dos imigrantes haitianos. Países como os Estados Unidos conseguem se restabelecer após catástrofes como um terremoto, mas à população de locais como o Haiti, uma das únicas soluções é tentar a vida em outro local, ou viver de forma miserável. 

X DO PROBLEMA
Motivo importante que origina a descrença de muitos em relação à Rio+20 é que ela, muito provavelmente, não romperá com a forma como os Estados veem a questão ambiental, ignorando propositalmente o fato de que o grande causador das catástrofes e esgotamento dos recursos naturais é o nosso modelo de produção e consumo, oriundos de um sistema econômico que não vê barreiras ao lucro.
“Nos últimos 20 anos, desde o Rio-92, (os governos e a iniciativa privada) demonstraram amplamente sua incapacidade de enfrentar os desafios da crise ecológica. Não se trata só de má vontade, corrupção, ignorância e cegueira – tudo isto existe, mas o problema é mais profundo: o próprio sistema é incompatível com as radicais e urgentes transformações necessárias”, define Michael. 
A preservação do meio ambiente e reversão de diversas sequelas que o homem deixou na Terra necessitam de mudanças estruturais, e não apenas da promoção de incentivos fiscais a quem deixar de desmatar ou campanhas que incentivem o cidadão a tomar banhos curtos.
Iara dá sua opinião: “Não basta tecnologia, é preciso mudar a mentalidade das pessoas, os seus desejos precisam ser mudados. As pessoas têm que sair de um paradigma do desejo individual e consumo para uma visão do que é bom para o coletivo”.  
Para Beto, o respeito ao meio ambiente não é possível dentro dos marcos do capitalismo: “Eu acho que dá para avançar em pequenas questões no capitalismo, que dependem da boa vontade das pessoas, grupos ou partidos, mas não é possível avançar na questão essencial, porque a natureza é vista pelo sistema como uma fonte de recursos naturais para ser transformada em dinheiro”.
Tendo esses elementos em vista, é possível,
inclusive, prever algumas posições durante a Rio+20. Para Fátima, os países em desenvolvimento podem questionar a adoção de medidas ambientais por encarecerem e dificultarem as exportações, o que beneficiaria os países mais ricos: “Os países emergentes continuam com a velha tese de que compromissos na área ambiental podem resultar em protecionismo dos países do norte. Colocando parâmetros ambientais, na verdade os países do norte querem colocar barreiras às exportações”.
Em relação aos países mais ricos, Michael afirma: “A crise financeira internacional tem servido de pretexto para empurrar para mais tarde as medidas urgentes e necessárias para limitar as emissões de gases do efeito estufa. A urgência do momento - que já dura alguns anos - é salvar os bancos, pagar a dívida externa (aos mesmos bancos), restabelecer os equilíbrios contáveis e reduzir as despesas públicas. Não há dinheiro disponível para investir em energias alternativas,  ou para desenvolver os transportes coletivos”. 

SACOLINHAS
Essa cegueira proposital gera um discurso hipócrita, que tenta lucrar a partir de falsas iniciativas “verdes” e distribuir a culpa pela destruição do meio ambiente igualmente entre cidadãos e empresas.
O sistema comprou a ideia de que é necessário cuidar do planeta, e agora tenta vende-la ao cidadão. Exemplo desse processo pode ser percebido através do número de produtos que anunciam em suas embalagens que são “verdes”. Esse percentual cresce a cada ano, mas o compromisso nem sempre é cumprido. Renata exemplifica: “A empresa coloca na embalagem ‘somos sustentáveis, investimos em projetos socioambientais’, mas às vezes o dinheiro que ela investe é 0,01% do recurso que ela investe em práticas insustentáveis, que vão contra os 
direitos humanos e contra a capacidade de recursos naturais do planeta”.
A prática de induzir o consumidor a comprar um produto a partir de um falso apelo verde é denominada greenwashing (lavagem verde, em tradução livre), e tem se tornado muito comum. A empresa de consultoria norte-americana TerraChoice realizou uma pesquisa e constatou que, em relação ao ano anterior, houve um aumento de 73% nos produtos que se dizem verdes em 2010 nos Estados Unidos. 
Segundo a empresa, 95% destes produtos se utilizaram de greenwashing. Exemplos dessa prática são, por exemplo, o emprego de palavras vagas, como natural, para passar uma falsa ideia de sustentabilidade ou estampar embalagens com falsos certificados ambientais.
Outra maneira que as empresas e governos encontraram para tentar tirar de si mesmos a etiqueta de principais poluidores foi dividindo a culpa com os cidadãos. Na televisão, são muitas as propagandas que frisam a importância de economizarmos água, se utilizando da manjada frase “Se todos fizerem sua parte, o mundo será um lugar melhor”. Mas será que a nossa parte é igual às dos governos e empresas?
Para Fátima, da mesma forma que os países desenvolvidos e em desenvolvimento devem ter responsabilidades diferenciadas na preservação do meio ambiente, os cidadãos não podem estar em pé de igualdade com outros setores: “A pessoa que mora em uma comunidade que mal tem acesso à eletricidade e que agora conseguiu comprar seus eletrodomésticos não pode ser convocada a participar da salvação do planeta no mesmo nível que aqueles que consomem a grande maioria dos recursos naturais”.
Outro exemplo desse processo de “divisão das responsabilidades” está em curso no Estado de São Paulo. Uma Lei sancionada pelo Prefeito Gilberto Kassab previa que a partir de 1º de janeiro deste ano os supermercados parassem de distribuir sacolinhas plásticas, devendo disponibilizar aos consumidores sacolas biodegradáveis, pelo preço de R$ 0,19 cada.
Após embates na Justiça, a lei foi cancelada, mas recentemente o Ministério Público do Estado de São Paulo e a Associação Paulista de Supermercados (APAS) assinaram um Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAQ), no qual os supermercados se comprometem a disponibilizar as sacolinhas apenas até o dia 3 de abril. 
Beto questiona a medida: “A princípio eu não acho ruim que nós diminuamos o uso de plástico, porque ele demora muito tempo para se decompor. Mas porque só as sacolinhas? Hoje a maioria dos produtos dos supermercados são embalados em plástico. Mais uma vez a classe trabalhadora vai pagar a conta, porque a sacolinha plástica vai ser substituída por uma outra que é paga, e antes o preço da sacolinha ia embutido no preço do produto, e muito provavelmente os produtos não vão ficar mais baratos”.
Não se trata de ignorar a responsabilidade que nós temos na preservação do planeta, mas exigir que ambos os lados tenham que mudar suas atitudes, e de forma proporcional ao mal histórico que causaram ao meio ambiente.
Infelizmente, a questão ambiental, apesar de urgente, ainda está permeada de hipocrisia e discursos vagos. Um avanço: a sociedade está muito mais ciente de que os recursos naturais não são eternos, e também sabem muitas das práticas que poluem a água, o ar, etc. A Rio+20 possivelmente mostrará quem realmente está interessado em alterar a maneira como lidamos com o nosso planeta, e quais mãos podem ser responsáveis por mudanças efetivas. 

Bárbara Mengardo é jornalista.


BOX 1
Mais de 40 anos de debate ambiental
Um dos principais motivos para que haja muita descrença em torno da Rio+20 é o fato de que a ONU vem realizando conferências, relatórios e agendas há 40 anos, sem, até hoje, conseguir mudanças estruturais na maneira como os países se relacionam com o meio ambiente, principalmente os maiores poluidores. Abaixo estão listados alguns dos encontros que trataram desse tema.
A primeira conferência que se propôs discutir a relação entre os problemas que o planeta enfrentava, como degradação dos oceanos e atmosfera, com determinadas ações promovidas pelo homem foi a Conferência das Nações Unidas Sobre o Homem e o Meio Ambiente, realizada no ano de 1972 em Estocolmo, Suécia.
Em 1990, o IPCC (sigla em inglês para Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), órgão da ONU que realiza pesquisas sobre o clima, lançou relatório que ligou a emissão de Gases do Efeito Estufa (GEE) à atividade humana, e previu aumento médio na temperatura global de 0,3ºC a cada década caso não houvesse mudanças nessas atividades.
A Rio92, ou Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, aconteceu no Rio de Janeiro em 1992, e produziu a agenda 21, documento que visa a promoção do desenvolvimento sustentável, baseado no respeito ao meio ambiente e justiça social.
Da Rio+20 saíram também as COPs (sigla em inglês para Conferência das Partes), encontros dos países que assinaram acordos sobre a biodiversidade e mudanças climáticas na Rio+20. Em 1997, a COP-3, realizada em Quioto, no Japão, desenvolveu o Protocolo de Quioto, que obrigava os países membros das Nações Unidas a reduzirem, entre 2008 e 2012, 5,2% das emissões de GEE em relação a 1990. A última COP, de número 15, foi realizada em 2009 em Copenhagen, Dinamarca.

BOX 2
Cúpula
Paralelamente à Rio+20 oficial são esperadas muitas mobilizações em todo Brasil. Exemplo disso é a Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça Social e Ambiental, evento que reunirá ONGs, movimentos sociais e membros da sociedade civil para discutir a fundo temas que estarão de fora da Conferência da ONU ou não serão tratados com a devida importância, além de dar voz aos povos que estão sendo afetados pela desigualdade, destruição do meio ambiente e ausência de direitos inerentes a esse sistema econômico.
Sob o chamado “Venha reinventar o mundo”, a Cúpula dos Povos acontecerá no Aterro do Flamengo entre os dias 15 e 23 de junho, e aceitará inscrições de pessoas e organizações a partir de abril. O evento terá grupos de discussão autogestionados, uma Assembleia Permanente e um espaço para organizações e movimentos sociais exporem, praticarem e dialogarem com a sociedade sobre suas experiências e projetos.
Fátima Melo, da ONG FASE-Solidariedade e Educação, que também integra o Comitê Facilitador da Sociedade Civil Brasileira para a Rio + 20, que está organizando a Cúpula dos povos, explica um conceito que guiará o evento: “O conceito de justiça ambiental, que a Cúpula dos Povos vai colocar em discussão, é a ideia de que os impactos ambientais desse modelo recaem de forma mais dramática sobre as populações excluídas, e elas não devem pagar o preço disso, mas devem ter de volta o direito a seus territórios e à sua forma de se desenvolverem”. 

Dyneas Aguiar é homenageado em Congresso da UJS-SP

A UJS-SP realizou neste fim de semana, em Itu, seu 15º Congresso Estadual, com a participação de mais de 500 jovens. O evento contou também com a presença de várias personalidades, como Orlando Silva, ex-ministro dos Esportes, Nádia Campeão, presidenta estadual do PCdoB, André Tokarski, presidente nacional da UJS, entre outros.


dineas
Dynéas (terceiro da esquerda para direita) recebe homenagem dos jovens socialistas

Além desses, esteve presente um convidado especial, Dynéas Aguiar, que recebeu homenagens por sua história.

Dynéas começou sua militância no PCdoB em 1950. Neste mesmo ano, ele já integrava a diretoria geral da UBES (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas), em 52 se tornou presidente da entidade. Combateu as idéias reformistas após o 20º Congresso do PCUS (Partido Comunista da União Soviética), participou da reorganização do PCdoB, e do Comitê Central em 1962 do mesmo partido. Nos anos 70, foi receptor de apoios internacionais aos comunistas brasileiros em Buenos Aires. Nas suas batalhas, pode-se destacar a campanha pela reforma do ensino, a do petróleo é nosso, além da campanha nacional e internacional pela paz e o fim da guerra no Coréia.

Já para os estudantes, Dynéas foi quem começou a briga pelas meias-tarifas, lutou pelos direitos de meia-passagem de ônibus, meia-entrada em atividades culturais como teatro, cinema, estádios. Infelizmente naquele período, ele não conseguiu concretizar esses objetivos, mas é importante lembrar que se hoje temos essa conquista, foi porque tivemos guerreiros para lutar por eles, e Dyneas é o ponto inicial dessa batalha.

Embora tenha tido sua vida sempre atrelada ao Socialismo, pelos direitos à igualdade, à dignidade à classe esquecida e menosprezada do nosso país, Dynéas nunca foi filiado à principal organização que defende esses mesmos ideais - a UJS. Por isso, a UJS o homegeou com a entrega de uma placa comemorativa de filiação, Dyneas também foi eleito presidente de honra da UJS-SP.

Com o nome estampado em uma placa de filiação da UJS, Dynéas passou a ser o mais novo integrante da entidade. Ele recebeu a placa pelas mãos de Algela Meyer, militante do movimento secundarista.

Dynéas falou ao congresso, “recebo essa placa emocionado, agradeço muito a esse mérito. Quero que saibam que vocês não devem ser o futuro do país, são o presente desse país! Queremos muito mais, e o “mais” não significa a negação do passado, significa as melhorias do presente que vivemos, para construir um futuro melhor. A UJS de futuro, um futuro de transformações, é a escola da formação política do jovem, o futuro do Socialismo!”.

Fonte: www.ujs.org.br
Profº Cleber de Oliveira

Festival Cinema pela Verdade exibe filmes sobre ditadura

Desde maio, o Festival Cinema pela Verdade, está percorrendo 81 universidades do país, para exibir, gratuitamente, filmes que abordam a Ditadura Militar (1964-1985). 


Após a exibição de cada sessão, são realizados debates sobre a temática com acadêmicos, pesquisadores e participantes. A previsão é que a última sessão do festival termine, em Brasília (DF), no mês de agosto.

Júlia Motta, coordenadora do Festival Cinema pela Verdade, explicou que a mostra pretende tornar os universitários mais críticos, além de fazer repensar sobre o período da Ditadura Militar no Brasil.

"O evento é realizado em universidades justamente com o intuito de preparar os jovens para se tornarem um público crítico. É necessário repensar a Ditadura Militar no Brasil. Nosso país precisa reviver esse momento, para entrar numa democracia de fato, por isso são importantes as exibições e os debates que ocorrerão no festival”.

Para ajudar no Festival, foram escolhidos 27 universitários de diferentes regiões do país, para promoverem o evento em seus estados. Estes universitários/as ajudam na exibição de filmes e no desenvolvimento das atividades locais do festival.

"Serão exibidos 3 filmes principais da Mostra em todas as universidades, são eles: Condor (2007), Cidadão Boilsen (2009) e Hércules 56 (2006). Poderão haver mais exibições em uma universidade do que em outra, isso depende da disponibilidade de filmes”, pontua Júlia.

Além destes três filmes, algumas universidades também exibirão os longas-metragens Diário de uma Busca (2010) e Uma longa Viagem (2011).

A coordenadora afirma que mesmo com a maioria das universidades em greve, diversas pessoas estão participando do evento. "Desde o início do festival, no dia 16 de maio e até o dia 31 de maio, nós tivemos uma média de 4.070 pessoas que participaram de 56 sessões. Com várias universidades do país em greve, esse número é bastante positivo. Os auditórios das universidades são pequenos, e quase sempre as sessões estão cheias”.

Próximas sessões

De acordo com a programação do evento, entre os locais que ainda irão receber as sessões do Festival Cinema pela Verdade, estão: João Pessoa (PB), nos dias 13 e 14 de junho; Belo Horizonte (MG), nos dias 12 e 14 de junho; Bahia, nos dias 12 e 14 de junho; Rio Grande do Sul, nos dias 11, 12, 14, 15, 20 e 21, e a capital do Acre, Rio Branco, nos dias 21, 22, 26 e 27 de junho.

Fortaleza, capital do Ceará, receberá a mostra duas vezes, sendo a primeira nos dias 11 e 12 de junho, e a segunda, nos dias 2 e 3 de agosto. Brasília também receberá o evento em agosto, porém a data ainda não está definida.

Saiba mais sobre o Festival no facebook: http://www.facebook.com/FestivalCinemaPelaVerdade?filter=1

Com Adital

Pesquisadora aborda riscos da reprodução assistida para a mulher


Formada em medicina pela então Escola Paulista de Medicina em 1972, atual Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a feminista Ana Reis se debruça há anos em pesquisas sobre manipulação de embriões humanos com recorte de gênero. Fez parte do grupo técnico do Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM) e criou no Ministério da Saúde uma Comissão de Estudos dos Direitos da Reprodução.



Mestre em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo pela UFBA, Ana Reis expõe o que ela chama de “visão feminista radical e não religiosa sobre o uso dos embriões humanos”, tema que, segundo ela, carece ainda de muito debate. Por que o processo de fertilização in vitro pode ser maléfico para as mulheres? Qual o papel que as mulheres desempenham na corrida científica por avanços na manipulação de células-tronco? Como os órgãos institucionais ligados à saúde atuam no tema? O que a Monsanto e a lei de biossegurança têm a ver com tudo isso?



Caros Amigos: Por que você acha que o processo de fertilização in vitro pode ser prejudicial para as mulheres?
Ana Reis: É um processo que tem muitos riscos e muitas falhas. As estatísticas são muito precárias e muitas vezes não verdadeiras. Eu estava olhando as estatísticas europeias e quando você fala só em fertilização in vitro, sem entrar em inseminação artificial, nos principais países da Europa as taxas de sucesso são de 20%, no máximo 25%. Ou seja, as taxas de fracasso são de 80%.

A questão toda é muito focada nos embriões, acredito que temos que trazer o foco para a saúde das mulheres e os riscos que elas correm. A coleta dos óvulos é um procedimento que fica sempre oculto, não aparece, as pessoas não conhecem isso. E é aí que está o risco maior, o risco da hiperestimulação ovariana. É uma doença que não existia e hoje tem até uma síndrome causada pela intervenção médica. Em casos leves vai desde o aumento do tamanho dos ovários até casos de vazamento de água para o abdômen, coma e até morte. Minha preocupação do ponto de vista médico é essa, mas há também as muitas implicações sociais desse processo da medicalização da reprodução humana.

Caros Amigos: Fale um pouco sobre essas consequências sociais.
AR: No Brasil existe um vácuo enorme da legislação sobre isso. Faz mais de 30 anos que esse processo está acontecendo no país e até hoje não se legislou convenientemente. Os legisladores são tão preocupados com a questão do aborto. Por que esse desinteresse em regulamentar o uso de embriões humanos? Quem tem feito as discussões do que se pode ou não fazer é o próprio poder médico, o Conselho Federal de Medicina (CFM). Comparando as resoluções do CFM sobre doação e comércio de óvulos, vemos que em um documento de 1992, as clínicas e os médicos tinham obrigação de dizer quantos embriões foram formados, quantos óvulos colhidos. Já na modificação feita em 2010 isso não mais aparece. Então as mulheres não são mais informadas de quantos óvulos foram colhidos.

A questão da procriação não envolve só aspectos biológicos, ela é eminentemente uma questão social. As estruturas de parentesco são um dos pilares de fundação das sociedades. Por exemplo, a maternidade substitutiva é conhecida popularmente como barriga de aluguel por conta de uma novela que levou esse nome. Todas essas questões estão sendo levadas à sociedade dessa forma, como por novelas, é o aspecto folhetinesco que interessa. Não é uma maneira séria de discutir a questão.

Não se pode fazer uso da maternidade substitutiva com uma pessoa desconhecida: é necessário que seja um parente ou então a ser decidido pelo CFM. Então é o poder médico que decide quem pode ou não ser aceita como uma mãe sub-rogada, que é o termo técnico. Será que a sociedade delegou isso ao poder médico? Será que tem consciência do poder desse órgão sobre esses processos? Eles que escolhem os doadores de esperma, as doadoras de óvulos. Que critérios são usados? E tudo isso é muito nuançado, mas caminha para uma seleção eugênica, e a gente sabe historicamente o que significaram essas seleções eugênicas.

Fora a questão da construção social do desejo de maternidade. É uma coisa fortíssima. Eu estava lendo aqui um parecer do Conselho Regional de Medicina de São Paulo que autorizou um médico a fazer uma maternidade substitutiva, a justificativa é “o desejo natural das pessoas de terem filho”. Esse desejo não é natural. A maternidade não é destino das mulheres, é uma construção social. Os homens não são tão desvalorizados socialmente se não têm filhos. Para as mulheres existe esse peso, é como se você tivesse falhado. O que acontece com todas essas mulheres que se submetem a altas doses de hormônios? Alguns desses hormônios são recombinantes...

Caros Amigos: O que é hormônio recombinante?
AR: Sim, a maioria das pessoas não sabe o que é: são obtidos por técnicas de energia genética que são ratas produzindo um hormônio humano. A porcentagem de pureza desses hormônios nunca é 100%. Não sei se as pessoas iriam gostar se soubessem que estão usando hormônios fornecidos por ratas, elas deviam ao menos saber. Todas essas coisas tem que ser debatidas, as mulheres tem que ter conhecimento das reais taxas de fracasso desses métodos e dos reais riscos. O CFM, nas suas resoluções teve essa preocupação de dizer que as clínicas têm que ter o registro permanente das gestações, das más formações dos fetos, dos abortamentos. Mas essas estatísticas não são divulgadas.

Caros Amigos: Você afirma que o Sistema Nacional de Produção de Embriões da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de “bancos de células e tecidos germinativos” não existe para zelar pela saúde da mulher. Por quê?
AR: A Anvisa que devia ter uma fiscalização, o que fez? Depois que foi aprovada pelo STF a manipulação e o uso para terapia e pesquisa dos embriões, foi feito um sistema de vigilância para saber o registro que as clínicas fazem do número de embriões que estão estocados. Depois de um tempo alguns ficam inviáveis e são descartados, esses embriões todos são objetos de outros interesses. Ao invés da Anvisa fazer uma fiscalização e levantar dados sobre a incidência desses processos na saúde das mulheres, o foco é só em quantos embriões estão lá disponíveis. Para quem? Para pesquisa e para a bioindústria. Esse sistema se chama Sistema Nacional de Produção de Embriões. Então o objetivo é esse? Produzir embriões? As clínicas são chamadas de bancos de células. Banco? A gente sabe o que é um banco: é uma coisa que vende para você algo que já é seu.

E o debate das células-tronco? Para a maioria das pessoas esse tema é apresentado como se fosse uma oportunidade maravilhosa de desenvolvimento das possibilidades médicas, que pode ajudar, por exemplo, a descobrir a cura do câncer.

Descobriram que as células-tronco não existem apenas nos embriões, estão no corpo inteiro. As células-tronco de fato têm o potencial de serem maravilhosas, mas por enquanto são muito mais promessas do que realidade. Faz muitos anos que se está pesquisando e os resultados não são tão espetaculares. As células-tronco adultas podem ser usadas também para fazer reparação de tecidos. Então são empregadas como se fosse uma substituição do transplante em alguns casos. É possível, por exemplo, colocar células-tronco no tecido do miocárdio que está lesado por causa de um enfarto.

Caros Amigos: E aí elas se multiplicam e regeneram o tecido.
AR: Essa é a ideia. Já que o transplante é um procedimento enorme, tem o risco da rejeição, a pessoa tem que tomar remédios pesados que mexem com o sistema imunológico. Então é claro que qualquer coisa que venha melhorar isso seria fantástico. Agora, o argumento que se usa é que só as células-tronco embrionárias são totipotentes, que podem se transformar em qualquer tecido. Será que isso tem a ver com o Sistema Nacional de Produção de Embriões? As mulheres vão ficar fornecendo embriões para isso? É proibido pelas resoluções, mas é uma coisa que ninguém controla. Quando se faz uma hiperestimulação hormonal, em que se colhe 20, 30, 40 óvulos, não se pode controlar quantos óvulos ficaram na mão do banco e quantos foram computados. Em princípio a gente confia na ética dos médicos, mas temos exemplos como o do Abdelmassih que durante anos foi dono da maior clínica de reprodução da América Latina. Tenho uma matéria que salvei aqui que é da festa de 5 mil bebês da clínica, antes de ele ter sido condenado por estupro, veja o Roberto Carlos aqui com ele. Durante anos esse médico exibiu os pacientes famosos, que é contra a ética. E o CRM de São Paulo nunca se incomodou com isso. Foi, no mínimo, omisso. Ele estava toda hora na televisão. Outro dia um médico, Marco Augusto Bastos Dias, consultor da área técnica da saúde da mulher do Ministério da Saúde, que defendeu as casas de parto, recebeu uma censura pública por parte do Conselho. E o Conselho não fez nenhuma censura pública para o Abdelmassih. Por quê?

Caros Amigos: E o que a Monsanto e a lei de biossegurança têm a ver com essa discussão?
AR: Todo o debate das células-tronco, quando foi lá para o Supremo, o que é que acontece? Foi oficializada na chamada Lei da Biossegurança, que na verdade é a lei que regulamentou e legitimou o uso dos transgênicos. A soja transgênica vinha sendo contrabandeada, estava numa situação ilegal. Então essa lei legalizou a questão dos transgênicos e toda uma série de outras manipulações genéticas. Além de algumas coisas que a indústria farmacêutica e de testes biológicos já usava, como os hibridomas. Será que todos os deputados sabem o que é um hibridoma? Eles estavam legislando sobre hibridomas.

Caros Amigos: O que é um hibridoma?
AR: São células híbridas resultantes do linfócito B tirado do baço de animais que são fusionados com células de mieloma, que é um câncer da medula óssea humana. O câncer é usado para multiplicar enormemente essas células, que fornecem anticorpos. São usadas nos testes de algumas doenças, então se pode marcar se a pessoa tem ou não uma reação imunológica àquela doença. Essas coisas todas, como já estavam estabelecidas, ficaram fora da lei. Entraram outras, principalmente a manipulação das sementes, que são todas patenteadas. A manipulação das células embrionárias humanas foi embutida nessa lei. Outra pergunta: o que faziam os embriões humanos na lei da soja transgênica da Monsanto? Evidente que tinha um lobby enorme para aprovar essa lei e os embriões humanos foram no meio.

Não estou sacralizando os embriões. Não acho que eles são intocáveis. Quando a igreja entrou, por meio de um advogado, com uma ação de inconstitucionalidade da lei no Supremo, o STF, por uma acrobacia jurídica, separou os embriões que podem ser manipulados com a questão do aborto. Ah sim, uns foram feitos numa clínica, os outros estão dentro do útero de uma mulher, então são completamente diferentes. Uns pertencem aos seus “criadores”. Os outros... não pertencem às mulheres. É claro que os embriões são os mesmos! Mas a vontade das mulheres nunca é respeitada.

Caros Amigos: E como é o processo de obtenção desses óvulos?
AR: Os espermatozóides são muito fáceis, todo mundo sabe, é por masturbação. Os óvulos não são obtidos por masturbação e nem saem espontaneamente. A gente normalmente produz um óvulo por ciclo. Esse processo vai ser totalmente monitorado por fora, então não pode ter nenhuma produção endógena do próprio corpo da mulher. Então eles silenciam o hipotálamo e começam com a hiperestimulação da formação dos óvulos. Depois tem que dar outro tipo de hormônio para que esses óvulos saiam do ovário. Quando um óvulo sai do ovário, a trompa do útero é atraída quimicamente, se move, e capta aquele óvulo. Aí ele vai nadando pela trompa e vai encontrar com o espermatozóide.

Com a hiperestimulação, eu já vi relatos e artigos que falam na captação de 40, 50 óvulos. Então imagina como fica o tamanho do ovário. Você, então, tem que ficar monitorando hormonalmente e vai fazer vários ultrassons. Então é um processo que durante aquele mês a mulher tem que ficar totalmente voltada para isso, com aplicações diárias de hormônios. Vai fazer vários exames também e quando acharem que os óvulos estão maduros eles têm que ser aspirados. A captação é por uma agulha com uma seringa que entra pela vagina e isso é um processo cirúrgico, feito com anestesia. Vai botar numa placa de Petri, fazer a fecundação. Ou eles são transferidos à fresco, que dá menos fracasso, ou são congelados.

Os riscos têm que ser conhecidos. Se a pessoa tiver pleno conhecimento dos riscos que envolvem o processo e as taxas de fracasso, talvez ela se decida por outra coisa. E mesmo se decidir por isso, está ciente do que acontece e o que acontecerá com o corpo dela a curto, médio e longo prazo. Porque esses hormônios continuam lá, é difícil fazer essas estatísticas porque existem vários outros fatores que podem influenciar os números, mas já estão falando que aumenta a incidência de câncer de mama, ovário, endometriose, etc.

Caros Amigos: Como se adquirem os embriões para pesquisa?
AR: A comercialização de embriões é proibida. Os usados em pesquisas são esses chamados excedentes da fertilização in vitro. Porque a fertilização in vitro é necessariamente excedente. A pessoa quer ter um filho, eventualmente deixa outro congelado, mas ninguém quer 10, 20, 30 filhos.

Caros Amigos: Quais os interesses econômicos por trás da manipulação de embriões?
AR: Tem um artigo, “Por trás da fraude coreana”, de H. T. Goranson, que saiu no Jornal da Ciência em outubro de 2006, comentando a fraude na Coreia, que um pesquisador lá anunciou que tinha feito a primeira linhagem de células-tronco. A grande questão é essa: como a célula-tronco ativa as transformações? Como uma célula se transforma nesse e naquele tecido? Tem uma corrida enorme para descobrir isso.

Porque se as técnicas de reparação de tecido realmente derem certo e o uso crescente de embriões para testes de novos medicamentos (a indústria farmacêutica, ao invés de testar em pessoas testa em tecidos de embriões, o que considero bom) também funcionar, todos esses processos de modificação de tecidos podem ser patenteados. “Quando cientistas descobrirem como ligar/desligar esses comutadores, poderá ser possível implantar células-tronco no organismo e ativá-las para que substituam corretamente tecidos danificados, sejam quais forem. A competição ganhou dramaticidade máxima depois que a principal força pesquisadora, os EUA, abandonou a corrida devido à influência da religião na política”. Ele fala que o país que conseguir ganhar essa corrida vai acrescentar à economia de seu país o equivalente a um campo petrolífero! As mulheres serão postas a fabricar esse petróleo? As mulheres que vão a essas clínicas sabem que estão fazendo parte de um sistema nacional de produção de óvulos?

Ainda que a busca por uma enorme quantidade de lucro esteja por trás do processo dessa pesquisa científica, do ponto de vista médico e tecnológico parece interessante que consigamos manipular essas células embrionárias. Como seria possível fazer esse tipo de pesquisa sem que os corpos das mulheres fossem usados como máquinas de produção de óvulos?

Com células-tronco adultas. Muitas pesquisas já estão sendo feitas com células-tronco adultas. Quando eu li esse artigo fiquei me perguntando se a verdadeira insistência no uso das células embrionárias não é por conta do patenteamento. Aliás, como é que se chegou ao ponto dessas coisas serem patenteadas? Existe uma luta internacional muito forte contra o patenteamento de sementes, sejam vegetais ou animais. É a mercantilização da vida. Aqui no Brasil parece não estar na pauta dos movimentos. Eu também acho que seria fantástico o avanço científico nessa questão, mas ainda não temos os resultados dessa pesquisa, dessa corrida. Os sucessos e as possibilidades são sempre anunciados de maneira propagandística, espetacular. Eles aumentam as expectativas para ter mais dinheiro para as pesquisas. Em um artigo publicado na Folha de S. Paulo, chamado “Paixão emperra debate, afirma cientista”, de Marcelo Leite, o entrevistado, o médico José Eduardo Krieger, afirma que pode “legitimamente dourar a pílula” e adotar uma hipocrisia aceitável quando você infla as possibilidades de sucesso dessas técnicas. “O auto-engano às vezes tem o seu papel numa sociedade”, ele fala.

Caros Amigos: Você chegou a dizer que a Igreja Católica tem ligação com laboratórios que trabalham com embriões, é isso?
AR: Sim, a Igreja Católica era sócia do laboratório que faz os hormônios que estimulam a produção de óvulos.

Caros Amigos: Que laboratório?
AR: O Serono. No fim do século 19 já existiam pesquisas com os hormônios, mas elas se intensificaram depois da I Guerra Mundial. Na Europa morreram muitas pessoas, principalmente homens, então o repovoamento da população era estratégico. Então houve muita pesquisa para estimular isso, reverter o alto índice de infertilidade, etc. Descobriram que na urina das mulheres menopausadas existe um hormônio, gonadotrofina, que é muito parecido com o hormônio da gravidez. Então precisava de muita urina de mulher menopausada para colher aqueles hormônios. Iam caminhões pipa dos conventos italianos para a Suíça, que é onde o laboratório estava sediado.

Caros Amigos: Caminhões pipas de xixi de freiras?
AR: Sim. Eu vi o caminhão pipa em folheto de propaganda do laboratório. E esse laboratório, dos anos 1980 para cá, só cresceu. O volume de dinheiro que envolve a fertilização in vitro no mundo é da ordem dos bilhões de dólares. Esse laboratório foi comprado recentemente pela Merck, que todos os laboratórios que dão certo os grandes papam. E passaram a fazer hormônios sinteticamente através da manipulação genética das ratas. Criou-se um mercado enorme para isso e o Vaticano era sócio do laboratório. É muito difícil rastrear se ele continua sendo.

Caros Amigos: Para terminar, conte um pouco como foi o episódio que estreou esse processo no Brasil.
AR: No Brasil essa coisa toda começou já com um espetáculo. O Nakamura, um dos pioneiros da fertilização in vitro no Brasil, fez um acordo com a Rede Globo. Vieram os médicos da Austrália para ensinar como se fazia a transferência de embriões. Então preparam 10 mulheres para fazer o processo. Alugaram dois andares do Hospital Santa Catarina, um só para a Rede Globo, que patrocinou tudo com a contrapartida da exclusividade na transmissão. E durante o show, uma mulher morreu, Zenaide Maria Bernardo.

Caros Amigos: E aí?
AR: Ficou por isso mesmo.

Fonte: Caros Amigos

Seppir articula discussão sobre racismo e sustentabilidade na Rio + 20


Seppir articula discussão sobre racismo
e sustentabilidade na Rio + 20

Debate terá como tema os desafios implícitos nas relações entre nãoinclusão, ambientalismo e desenvolvimento socioeconômico


Como o racismo prejudica a realização do conceito básico de sustentabilidade, nos níveis social, econômico e ambiental? É possível efetivar uma política de desenvolvimento sustentável conjugada com a manutenção de situações de injustiça social e nãoinclusão para uma população que, segundo os dados do último Censo /IBGE (2010), se declara majoritariamente afrodescendente? Como os aspectos centrais da questão racial na sociedade brasileira impactam o grande desafio da sustentabilidade socioeconômica no século 21?

Estes são alguns dos questionamentos que serão trabalhados no diálogo "Questão Racial e Desenvolvimento Sustentável", que é parte da programação da Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável - Rio + 20. A secretária Ângela Nascimento, titular da Secretaria de Políticas de Ações Afirmativas, será a representante da Seppir - Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial no debate.

Um dos resultados esperados da Rio + 20 no âmbito da discussão das questões raciais é a consolidação de um projeto de desenvolvimento sustentável em nível nacional e internacional que contemple a realidade às vezes não percebida das atuais relações de produção econômica: segmentos sociais diversos experimentam de forma diferenciada os impactos do desenvolvimento.
"Ao dizer isso, estamos afirmando aos chefes de Estado do Brasil e do Mundo e às instituições públicas e privadas que a dimensão ambiental do desenvolvimento socioeconômico demanda necessariamente uma política de valorização da população negra, em vez da desqualificação ou desautorização de modos de vida, e que é necessário avaliar a natureza exploratória e predatória de grande parte das atividades econômicas que propiciaram o crescimento econômico mundial nos últimos séculos", destaca a secretária Ângela Nascimento.

Problema internacional - É fato comprovado que, na contemporaneidade, a realidade socioeconômica de diversos países segue altamente influenciada pela reprodução de padrões históricos de desigualdade, entre as quais, as desigualdades raciais. Como de costume, é a população negra aquela que mais experimenta essa realidade de exploração, que perpetua situações de pobreza, carência e condições inadequadas de convívio social em vários aspectos.

"Desde a Conferência de Durban (2001) que se destacou, no plano de ação resultante do evento, a necessidade de os Estados considerarem medidas não-discriminatórias para oferecer um ambiente seguro aos indivíduos e membros de grupos que são vítimas ou estão sujeitos à discriminação racial e intolerância advinda disso", destaca a secretária Ângela.

Entre outros itens citados no Plano de Ação da Conferência de Durban (como ficou conhecida a III Conferência Mundial contra o Racismo, a Xenofobia, a Discriminação Racial e Intolerância Racial), estão a necessidade de melhorar o acesso à informação pública sobre saúde e questões ambientais e que tecnologias e práticas bem-sucedidas na melhoria da saúde humana e do meio ambiente sejam partilhadas.

A secretária Ângela Nascimento destaca um dos principais objetivos das discussões das questões raciais na Rio + 20, que é a instituição, pela Organização das Nações Unidas (ONU), da Década dos Afrodescendentes (2013/2022), na perspectiva de avanço nas políticas de desenvolvimento sustentável e sem racismo. "Estaremos na Rio + 20 reafirmando essas  ideias e ampliando o debate", afirma.

SERVIÇO - SEPPIR / RIO + 20
Diálogo "Questão Racial e Desenvolvimento Sustentável"
Local: Pavilhão Brasil Parque dos Atletas (Riocentro)
Horário: 17h às 19h